Na última sexta-feira, 31, o jornal Wall Street Journal noticiou que o polêmico aplicativo de transportes Uber, criado há cinco anos, teria levantado US$ 1 bilhão com investidores como Microsoft e o grupo de mídia indiano Bennett Coleman & Co. Com isso, a start-up passaria a ser avaliada em US$ 51 bilhões, valor recorde para uma empresa de tecnologia iniciante. Como comparação, nos seus primeiros sete anos, o Facebook chegou a valer US$ 50 bilhões.
O caso do Uber ilustra uma discussão recente sobre economia real x economia virtual. Na primeira categoria estão empresas que fabricam produtos tangíveis e demandam parques industriais e mão-de-obra em volume como Coca-Cola, Shell, Nike e outras. Do outro, empresas de tecnologia prestadoras de serviços como Google, Facebook, Twitter e Linkedin.
Para um grau de comparação com grandes empresas brasileiras, enquanto o Uber consegue ser administrado por uma dezena de funcionários, a Petrobras, que já foi uma das maiores empresas da América Latina, está avaliada, segundo o ranking da Fortune em US$ 25,3 bilhões e emprega 86 mil pessoas. O Banco do Brasil, maior banco público do País, vale US$ 18,4 bilhões e emprega 109 mil funcionários, enquanto o Twitter está avaliado em US$ 20,3 bilhões.
As diferenças ficam ainda mais notáveis quando se compara, por exemplo, o valor do Bradesco, US$ 20,4 bilhões, ao Linkedin, avaliado em US$ 23,3 bilhões. A diferença não é apenas o valor de mercado. Petrobras, Bradesco e Banco do Brasil possuem terrenos, imóveis e diversos outros ativos físicos o que as empresas de tecnologia não possuem. O Facebook, avaliado em US$ 212,4 bilhões, vale catorze vezes a Vale, estimada em US$ 16,9 bilhões, ou a cervejaria Inbev, avaliada em US$ 192,2 bilhões.
Essa diferença se sustenta? Estaríamos diante de uma nova bolha? A discussão voltou à tona após as ações do Google subirem 17%, em julho deste ano, e seus fundadores terem ganhado, em um dia, US$ 8 bilhões, quase o preço de uma JBS, avaliada em US$ 13,4 bilhões.
Michael Lewis, autor de vários livros sobre o Vale do Silício, defende que sim, o mercado de tecnologia passa por uma nova bolha, mas existe um lado positivo nisso. “As bolhas possuem um efeito colateral agradável. Levam jovens a empreender, fazer algo produtivo, ao invés de ir trabalhar no mercado financeiro”. Em março, em um evento da Adobe, o escritor ironizou o fato de empresas como o Snapchat serem avaliadas em bilhões de dólares. “É inconsistente”, disse.
A Nasdaq, bolsa de valores que negocia ações do setor, chegou aos cinco mil pontos no início deste ano, um indicador recorde. A última vez que isso aconteceu foi há 15 anos, em março de 2000, semanas antes do estouro da bolha pontocom. Comentarista de cultura digital do The Washington Post, Caitlin Dewey chega a comparar as empresas que dominam o meio de tecnologia aos empresários dos Estados Unidos do século 19 e a escravos que os alimenta de conteúdo. “Uma distopia gloriosa em que todo o mundo trabalha por ‘likes’, de graça, enquanto um punhado de magnatas de tecnologia lucra”, disse Caitlin.
Em sua coluna do último domingo, 2, o editor da Folha de S.Paulo, Sérgio Dávila, fez uma reflexão das bilhões de pessoas, no mundo, incluindo ele, que trabalham de graça para as empresas digitais. “Você trabalharia de graça quase uma hora por dia, todos os dias do ano, para uma empresa que ganha R$ 60 bilhões anuais com a sua produção e os seus dados? Parabéns: você, eu e 1 bilhão de pessoas fazemos isso para as redes sociais”, escreveu D’Ávila.
Economia real x Economia virtual*
Com o valor de um Facebook (US$ 212,4 bilhões) seria possível comprar a Inbev (US$ 192,2) e levar a Vale (US$ 16,9 bilhões) de brinde.
Pelo que vale o Twitter (US$ 20,3 bilhões) daria para levar o Banco do Brasil (US$ 18,4 bilhões) e sobraria (US$ 1,9) bilhão.
O valor do Linkedin (US$ 23,3 bilhões) seria suficiente para comprar a JBS (US$ 13,4 bilhões) e ainda sobrariam quase US$ 10 bilhões.
Já o valor de mercado do Google (US$ 664,5 bilhões) seria suficiente para comprar as 359 empresas do Ibovespa, avaliadas em US$ 723,5 bilhões.
*Os valores de mercado das empresas citadas na reportagem foram coletados na lista das 500 maiores empresas do mundo segundo a revista Fortune, logo, podem sofrer variações de acordo com o rendimento atual em suas respectivas bolsas e as diferenças cambiais.
Via @Meio & Mensagem
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